Dias chuvosos são sempre críticos para quem vive à
flor da pele. Ao que parece, quando chove, toda ela se arrepia com a
necessidade de banhar-se de emoções. Talvez seja o som delicado ou violento dos
pingos. Talvez seja o cheiro que penetra no corpo todo, e fica. Talvez seja a
paisagem toda enigmática em que cada um devaneia... Como a fumaça capaz de
cegar-nos a todos, aquela fumaça de eufemismo que nos faz observar a vida como
menos do que de fato é. Ainda estou tentando avaliar se isto é bom ou ruim - isto
de tornar garoa uma vida inteira que na verdade é um temporal. Por que não
permitir que o tal temporal, tantas vezes ácido, não corroa toda a ferrugem que
fica impregnada por todas as vezes em que dormiu em nós o sentimento reprimido?
Qual o sentido de não vivê-lo?!
Na alma vezes clara, vezes breu maçante à postura
moral, mora um medo desnorteante, um medo que não tem vez no coração de quem
vive de hipérboles. Vivi disso por um bom tempo. Porém agora estou pobre de
temporal... Garoa fina que vai aos pouquinhos esvaziando o que deveria já estar
fora de mim. Eufemismo de vida, e eu abismo sem fim. Pelo menos ainda há rimas.
Mas não precisa ser assim!... Somos feitos todos sensíveis, todos suscetíveis à
tristeza, e esta pobre coitada que jamais vai alcançar a glória de viver (que
existe?), é toda pisoteada, massacrada e escondida para sempre em nós... Se ela
fosse embora... Mas não vai. Ela fica. Só acumula. O fardo só fica maior e
maior... E nós essa gradação desvairada e doída.
O que falta ao entendimento de cada um é que a vida é
uma antítese infinita: um tudo que é nada, e vive versa. É um paradoxo parado
na atmosfera que nos rodeia. Quanto mais você esconder a tristeza, mais ela vai
aparecer, com mais frequência, com mais peso, com mais dor. E será pesada. De
nada adianta impor esse eufemismo. Nem mesmo a elipse, em casos extremos...
Então pare de fingir que tudo está como não está. Pare de se esconder debaixo
das cobertas das aparências. Desnuda-se, por inteiro. Só assim você será capaz
de sentir cada agulhada aguda do mal que lhe habita, e deixá-lo ir, liberando
espaço para a luz penetrar. Porque o negro fúnebre daquilo que morreu em nós,
que nos é luto, e que fica escondido no fundo do peito, ele não reflete luz
alguma. Para que se faça a luz da felicidade, ou do conhecimento, nada de ruim
pode nos habitar. Deixe ir. Deixe a tristeza escorrer até a última gota, até
evaporar por completo. Dar-se-á, portanto e por fim, renovação.
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